terça-feira, novembro 29, 2011

O atestado de pobreza


Pedro Passos Coelho passou, recentemente, um atestado formal de pobreza a Portugal. “Só vamos sair desta situação empobrecendo” foi a declaração do Primeiro-Ministro, referindo-se à austeridade em curso no país, que será substancialmente agravada no próximo ano.

Podemos fazer uma analogia. Imaginemos que o país é uma família comum portuguesa, que tem compromissos com a banca, que tem de honrar sob pena de perder a sua habitação. Se esta família empobrecer subitamente, é crível que possa manter os seus pagamentos? Claro que não. Ninguém sai de uma crise agravando os factores que estiveram na base desta crise.

É, por isso, uma falácia argumentar que Portugal sairá da crise em que se encontra tornando o país mais pobre. Esta explicação só se compreende como uma tentativa, quase desesperada, de explicar a razão pela qual se retirou, nos últimos meses, qualquer hipótese de retoma económica e de bem-estar social.

Vários economistas prevêem que a recessão, em 2012, fique entre os três e os cinco por cento, valores que demonstram uma economia no ponto mais baixo das últimas décadas, que terá como resultado o afastamento de convergência com a União Europeia. Assim sendo, como será possível “sair desta situação”, como alega o Primeiro-Ministro? Não será tão cedo, até porque, quando a troika deixar Portugal, a economia estará de rastos.

Passos Coelho até pode demonstrar determinação nas medidas que está a tomar, mas, como ele próprio admitiu, está a passar um atestado de pobreza aos portugueses a um ritmo diário.

Não se contesta a necessidade da adopção de medidas duras de equilíbrio das finanças nacionais. Aliás, estão são mesmo fundamentais para salvar o país, mas não se pode ficar por aqui. O pecado capital de Passos Coelho é esse mesmo. Resolver o problema orçamental à custa da economia real.

Já se percebeu que não há qualquer estratégia de crescimento económico para Portugal, em parte devido a um ministro desta pasta que ainda não sabe onde está, mas também à decisão política de “empobrecer” o país a cada dia que passa.

O atestado de pobreza que Pedro Passos Coelho nos passou a todos é, assim, uma equação sem solução: ficaremos mais ricos sendo mais pobres.

O Primeiro-Ministro, que esteve recentemente no Brasil, deveria ter aprendido com o exemplo deste país. Só ficou mais rico quando apostou na economia e na criação de riqueza. Esta é a solução óbvia para a equação.

terça-feira, novembro 22, 2011

Duques à portuguesa




País de brandos costumes, tradições e outros ícones, Portugal continua hoje à espera da chegada de D. Sebastião, desde que este tenha mesmo honrado os ossos portugueses em Alcácer Quibir e prometa desde logo livrar agora o país da mão dos “duques” que por lá (se) governam.

Escrevia Raul Brandão na obra “El-Rei Junot” que “A história é dor, a verdadeira história é a dos gritos (…) os homens debalde se agitam, desesperam, morrem (…) não passam de títeres”.

A história actual de Portugal é esta mesma. É a de um país cansado, é a de um país espezinhado, cuja história já não narra factos de sucesso ou de glórias (tirando o futebol) mas sim um enredo subterrâneo feito de motivos e motivações que quase ninguém tenta deslindar, porque tentando, é engolido pelos “duques à portuguesa”. Há deles em toda a parte e de todos os feitios.

Os mais recentes apareceram por cá em forma de voz e imagem na televisão e relatório escrito. A voz do ministro voltou a ecoar do alto da sua geografia de cartilha: “ A RTP é uma empresa nacional no Mogadouro ou nos Açores”, disse, como se “duque” Relvas fosse o dono de tudo ou mesmo quisesse desprezar estas ilhas e o Mogadouro, porque não são Lisboa, a capital do império, de onde (pensa ele) devem emanar todas as ordens para o país.

Depois veio o relatório de um Duque de sobrenome, que aos microfones de uma rádio pública, a RDP, vociferou raciocínios vários, desde a “Casa dos Segredos” até à própria RTP/Açores, dizendo, entre outras coisas, que ninguém vê a RTP/Açores e a RTP/Madeira, que ambas as estações já cumpriram a sua missão e que agora o que os “madeirenses querem, como os algarvios” é saber o que se passa em Portugal, conhecer o seu país.”

A dor da história destes “duques à portuguesa” é saber como contrariar a Autonomia (que lhes dói na alma, por dentro, quase queima) destas Regiões? De cá não vai ajuda para lá, a não ser de quando em vez uns abraços públicos e uns sorrisos (como os da célebre fotografia que circulou pelo Facebook da líder do PSD/Açores com os “Duques” Relvas e Passos Coelho) mais umas palavras, a propósito das medidas que eles lá vão tomando e que cá, salve excepção do relatório, o PSD/Açores vai apoiando, ora calado, ora falando…

Os exemplos desse apoio são variadíssimos. Os “duques à portuguesa” têm vindo a tentar abandonar as suas responsabilidades na Região. Os aeroportos que sempre foram da sua responsabilidade, querem que passem para a Região, não querem pagar os 5% de IRS devidos às autarquias. Quem querem que pague? O Governo dos Açores. Não querem financiar a RTP/Açores e querem que seja o Governo dos Açores a financiá-la. Não queriam pagar as casas do Povo, o PSD/Açores veio logo dizer: pague o Governo dos Açores!

Ora mas afinal, é justo perguntar-se: teremos nós “duques à açoriana”?

Os tempos que aí vêm vão prová-lo. Qualquer dia, de lá, “Duque Relvas” gritará: Aviões? Obrigações de serviço público? Isso há no Mogadouro? Não! Então para quê nos Açores?

E nessa altura já eles todos (os Duques de cá e os Duques de lá) hão-de estar como os personagens de António Lobo Antunes, em “As Naus”:

“(…) Esperámos, a tiritar no ventinho da manhã, o céu de vidro das primeiras horas de luz, o nevoeiro cor de sarja do equinócio, os frisos de espuma que haveriam de trazer-nos, de mistura com os restos de feira acabada das vagas e os guinchos de borrego da água no sifão das rochas, um adolescente loiro, de coroa na cabeça e beiços amuados, vindo de Alcácer Quibir com pulseiras de cobre trabalhado dos ciganos de Carcavelos e colares baratos de Tânger ao pescoço, e tudo o que pudemos observar, (…) foi o oceano vazio até À linha do horizonte (…)e os mestres de pesca, de calças enroladas, que olhavam sem entender o nosso bando de gaivotas em roupão, empoleiradas a tossir nos lemes e nas hélices, aguardando, ao som de uma flauta que as vísceras do mar emudeciam, os relinchos de um cavalo impossível.”

Para quem nunca leu: recomendo vivamente. Leiam no Natal para se abstraírem das notícias de Duarte Lima e, destes “Duques” todos, que um dia, sempre amparados uns nos outros, esperarão numa praia qualquer a chegada de um cavalo (impossível?). Nunca fiando.

segunda-feira, novembro 14, 2011

“O povo do caldo da portaria”

A falta de memória, a ausência de coerência e a falta de escrúpulos, na vida, como na política, descredibilizam o protagonista e criam repulsa a quem assiste incrédulo a este triste espectáculo.

Infelizmente a ambição do principal partido da oposição nos Açores, o PSD, pelo poder, tem levado a que assistamos a um conjunto, quase frenético, de intervenções e acusações ao Governo dos Açores, que não se compreendem pelo seu conteúdo falso ou porque estão verdadeiramente imbuídas de má-fé.

Já sabíamos que este partido com grandes responsabilidades políticas e a sua líder tem pautado as suas intervenções, nos últimos dois anos, por um estilo, como caracteriza um ilustre camarada meu, de “la Palisse”, da verdade óbvia, do “temos de fazer crescer a economia” ou do “o emprego é uma prioridade para o PSD” ou então do estilo concurso miss universo, do “sabemos que as crianças são o futuro” ou do “temos de apostar na educação das nossas crianças”.

Compreendo o entusiasmo de Berta Cabral neste tipo observações, são óbvias, facilmente compreensíveis, curtas como devem ser para os média e impossíveis de incorrer em erro, portanto, de contradição difícil por parte dos seus adversários.

Mas se como dizia Antero de Quental “O entusiasmo é bom, porque eleva o espírito; mas a crítica é melhor ainda porque o esclarece”, a forma como o PSD interpretou a crítica ao seu adversário, está mais próxima do logro do que da elucidação.

Explano dois particulares exemplos de críticas inconsequentes ou até falsas, que criam mais confusão e conflito e que em nada contribuem para o desenvolvimento da nossa terra:

O PSD incorreu numa inverdade ao afirmar que não há nos Açores uma política energética séria e coerente, quando é do conhecimento generalizado que os investimentos na área das energias renováveis, na nossa terra, são um exemplo a nível mundial. Para quem tem dúvidas sobre esta matéria, basta verificar os projectos pioneiros nesta área do MIT na ilha das Flores ou de uma grande empresa alemã na ilha Graciosa, que poderão significar a breve trecho, a sua quase independência energética de combustíveis fosseis.

No caso das SCUTs a posição deste partido foi de total ausência de memória, de contradição e até posso dizer, com alguma tristeza, de alguma má-fé.

O PSD\Açores referiu que o preço a pagar por estas estradas iria ser superior ao previsto e que o modelo de construção e financiamento deste empreendimento seria também insustentável para as futuras gerações. O que o PSD se esqueceu de dizer é que por um lado, pretendia que o projecto SCUTs, fosse alargado a outras ilhas, sendo portanto, muito mais caro do que é hoje e que por outro lado, já em 2001, previa que o valor das rendas das SCUTs, modelo que votaram favoravelmente no parlamento regional, deveria rondar os 750 milhões de euros, ou seja, mais do que o valor actual da obra.

São incoerências e acusações próprias de um partido que está mais preocupado com a sua campanha eleitoral do que em produzir propostas para ajudar as famílias e as empresas. É a lógica de Passos Coelho, da campanha da crítica pela crítica, da promessa dos cortes nas “gorduras do estado” que em nada deu! É a lógica de que todos os meios são utilizáveis, para que o “povo” de sociais-democratas possa voltar ao “caldo da portaria” para por ordem nisto!

Mas a este partido de Sá Carneiro exige-se mais responsabilidade. Exige-se propositura, crítica séria e diálogo!

Onde estão os contributos do PSD, numa altura tão difícil, para o Plano e Orçamento de 2012 que será discutido no final deste mês? Onde está a disponibilidade para falar com o Partido Socialista e com o Governo dos Açores para melhoramos em conjunto este documento? Porque é que o PSD dos Açores e Berta Cabral não seguem o exemplo do PS a nível nacional em matéria de Orçamento de Estado?

Para o PS a porta estará sempre aberta para o diálogo, como sempre esteve no passado, com resultados muito positivos de uniões, neste âmbito, com o CDS/PP e PCP, por um único motivo: Os Açores!



segunda-feira, novembro 07, 2011

"O PSD/Açores tem uma impressora"


É recorrente dizer-se que as passagens aéreas para o continente são caras. Claro que todos nós queríamos que fossem mais baratas, mas uma série de factores, alguns dos quais não controláveis pela SATA, impedem, para já, uma redução mais significativa dos valores.

Nesta reivindicação geral existem diversas motivações. A primeira, totalmente legítima, é a motivação dos açorianos, que reclamam, como é seu direito, preços mais baixos para viajarem para o continente. É até saudável que exista esta massa crítica genuína, porque aguça o engenho dos decisores políticos na procura de soluções.

Mas neste processo existe outra motivação: a do PSD/Açores, que, nunca apresentando uma única medida ou proposta concreta, se limita a dizer que as tarifas aéreas entre os Açores e o exterior são elevadas. O PSD/Açores é ainda o maior partido da oposição. Este estatuto deveria ser suficiente para concretizar, objectivamente, como pensa que é possível reduzir os preços praticados.

Em bom rigor, nesta matéria, não se deveria falar em PSD/Açores enquanto organização política, porque se trata, apenas e só, de um deputado regional que tem a incumbência deste dossier, que faz o que pode, mas faz muito pouco e até de forma quase caricata, mas sempre utilizando palavras caras e termos técnicos.

Um exemplo concreto de como trata o PSD/Açores a questão das tarifas aéreas: anunciou que está a fazer a monitorização – palavras do senhor deputado – do preço das passagens aéreas desde há alguns anos. Monitorização é um termo quase científico, que, pressupõe-se, implicaria um aturado trabalho de formação de preços, de estudo de frota, da evolução dos combustíveis, da oferta e da procura, das actuais obrigações de serviço público, da evolução das taxas de combustível, das indemnizações compensatórias, entre muitos outros factores.

Mas, na verdade, esta monitorização do PSD/Açores limita-se a… “print screens” dos preços disponibilizados na internet. Apenas e só, sem qualquer estudo adicional que permita perspectivar como se chegou à formação deste preço. Chamar monitorização a este procedimento básico é o mesmo do que dizer que um avião voa porque tem asas.

É pouco, muito pouco e, pior ainda, não resulta em qualquer proposta concreta. Para este PSD/Açores, basta um computador e uma impressora para resolver os problemas das tarifas aéreas. É simples, eficaz e apenas surpreende-me como este modelo não é aplicado no resto do mundo. Estão as companhias aéreas a gastar milhões de euros em sistemas de planeamento, essenciais para a redução de custos, quando o PSD/Açores tem disponível um modo barato e extremamente fiável de monitorização de tarifas. Fantástico!

Depois, o PSD/Açores recorre, sistematicamente, à Madeira como sendo o “alfa e o ómega” do modelo de transporte aéreo, esquecendo-se, por exemplo, que a grande concentração da população numa só ilha provoca um volume de tráfego incomparavelmente superior ao dos Açores ou de que uma viagem de ida e volta entre o continente e esta Região Autónoma, dura sensivelmente menos uma hora, do que para a nossa terra.

Tirando estes erros básicos de análise, o PSD/Açores deveria ouvir o que disse, recentemente, a secretária regional do Turismo e dos Transportes da Madeira, quando afirmou que o preço médio de uma reserva de última hora para uma passagem de ida e volta ronda os 271,64 euros, podendo até ser mais elevado. Foi uma governante do PSD que disse isso.

É verdade que todos nós defendemos tarifas mais baixas. É para isso que o Governo Regional está a trabalhar, nomeadamente na revisão das obrigações de serviço público, mas muito já foi feito neste capítulo. De 01 de Janeiro a 31 de Dezembro deste ano, a SATA disponibilizou, entre Ponta Delgada e Lisboa, um total de 39.969 lugares com tarifas promocionais que variam dos 62 a 139 euros, 16.995 dos quais já comprados.

Em 1995 os açorianos não tinham esta possibilidade. Os poucos que podiam, pagavam 60 contos (300 euros) por uma passagem e chegavam a Lisboa às duas da manhã. E nesta altura o PSD/Açores já tinha computadores e impressoras.

quarta-feira, novembro 02, 2011

Transformar Portugal num peso morto


Onde estaremos após 2013? Esta é a pergunta que não tem sido feita pelo país real, uma vez que não tem tido tempo para respirar e reflectir face à torrente imediata de medidas de austeridade a que tem sido sujeito nos últimos meses.

É perfeitamente compreensível que, nesta altura, uma família ou uma empresa portuguesa esteja mais preocupada em perceber como vai honrar os seus compromissos em 2012 do que em perspectivar a sua situação económica e social depois de concluído o programa de ajuda externa que Portugal subscreveu. Ou seja, estamos quase numa situação em que o fim do mês mete mais medo do que o fim do mundo.

É como se Portugal fosse um navio a afundar lentamente, com os seus passageiros mais preocupados em se manterem à tona de água, em vez de perceberem as razões que levaram a esta catástrofe e como poderão chegar, rapidamente, a um porto seguro. Em suma, é uma questão de sobrevivência imediata.

É neste contexto que o actual Governo da República se move, adoptando medidas que agravam a recessão, promovem o desemprego, atiram milhares para a desprotecção social e agravam a carga fiscal para um nível insuportável.

É o próprio Governo de Passos Coelho que assume este cenário, mas sem explicar aos portugueses que país será este em 2014, quando e se a “troika” sair de Portugal nesta altura. Nunca explicou quais serão os danos colaterais que resultarão destas medidas que vão muito para além do previsto no memorando de entendimento.

Apesar de nunca explicar como era sua obrigação, já que tem um mandato de quatro anos, é facilmente perceptível que estaremos de rastos. A economia estará em forte recessão, sem capacidade de reagir por si só, face à dependência externa a que está sujeita. O número de desempregados terá crescido consideravelmente, ao mesmo tempo que a protecção social devida pelo Estado terá sido reduzida ao mínimo. A carga fiscal continuará a ser insuportável para as famílias e as empresas, com a perca irreversível de direitos adquiridos, como os subsídios de férias e Natal.

Será, assim, um país sem músculo, que juntará às suas desvantagens endógenas uma debilidade conjuntural sem precedentes. Este será, sem grandes dúvidas, o cenário mais provável de Portugal para 2014.

Ou seja, Portugal corre o sério risco de passar de uma crise eminentemente orçamental, com um problema real de défice das contas públicas, para uma outra crise com maior pendor económico e social. Na prática, resolveremos o problema orçamental à custa do empobrecimento país real.

Qual a solução para um desempregado num país com uma recessão a beirar os 3%, podendo mesmo chegar aos 4%? Qual a capacidade de compra de uma classe média sufocada por impostos e cortes? Qual a capacidade de investimento de uma pequena empresa, que não vende, pelo facto do consumo interno estar reduzido a zero?

Estas são as perguntas que este Governo de Passos Coelho não sabe responder. Para já, o actual Governo da República assume-se como um mero executor de uma memorando de entendimento, com a opção clara de mostrar à “troika” que gosta de ir mais além. É, na verdade, uma espécie de direcção-geral das entidades externas, que não faz qualquer questão de lhes explicar que o país já está a sofrer mais do que pode e merece. Executa o que está estipulado, mas, para ficar nas boas graças, vai sempre mais à frente.

Se estivéssemos num naufrágio, este Governo da República estaria mais preocupado em salvar o navio do que as pessoas. Esquece-se do essencial: sem os passageiros e a tripulação, um navio não serve absolutamente para nada. Será um peso morto!